Por
pressuposto, os fundamentos para a proposição
de políticas públicas estão associados
à capacidade de selecionar, dentre as diferentes
alternativas (não apenas as possíveis
como também as plausíveis), aquelas
que melhor contribuam para o crescimento econômico
e o desenvolvimento, traduzido pela consubstanciação
de patamar mais elevado de bem-estar e cimentado por
menos acentuado grau de heterogeneidade social, fenômeno
tão característico do tecido social
brasileiro.
Diante dessas premissas, permite-se analisar se o
Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (PEPRO),
em sua edição anterior, atingiu as metas
precípuas de uma boa política. Em análises
anteriores, destacou-se que seus vícios de
origem (erro de oportunidade, baixa abrangência
e desenho deficiente) o impediram de alcançar
bom termo. Para confirmar tal assertiva, averigüe-se
o intenso debate sobre o assunto travado na mídia
especializada nos últimos meses.
Para a nova edição do PEPRO, compete
tecer outros detalhamentos relevantes, sempre tendo
por meta o êxito da política. Assim,
pode-se aplicar algumas hipóteses para avaliar
a consistência da política, como desvio
de foco; nível de interferência no funcionamento
do mercado; transparência; grau de burocratização
e gestão.
Na primeira versão do prêmio, houve imensa
perda de foco ao se permitir o livre acesso de imenso
número de cafeicultores empresariais ao subsídio
pago pelo Tesouro. Nessa nova edição,
poderia vincular-se a compra dos contratos de prêmio
apenas para os cafeicultores adimplentes junto ao
FUNCAFE e demais carteiras de financiamento rural.
Em análise anterior, comprovou-se que os pequenos
empréstimos, de até R$ 10 mil, possuem
menos de 2% de inadimplência, enquanto que os
acima de R$ 500 mil, mais de 30%. Assim, seria dado
o primeiro passo para a criação do cadastro
positivo da cafeicultura, com acesso ao PEPRO apenas
dos cafeicultores adimplentes e cujas amortizações
estão em dia.
O PEPRO carrega, intrinsecamente, grande interferência
no funcionamento do mercado. O fluxo de comercialização,
do qual dependem outros importantes elos do agronegócio
(exportadores, corretores, torrefadores e solubilizadores),
beira o colapso. Cria-se um clima de expectativas
de preços futuros mais compensadores (evidentemente,
pejado pela certeza de captura do subsídio)
e, assim, paralisação imediata dos trâmites
comerciais. A interferência no mercado, ensina
a boa economia, cria assimetrias nas quais justamente
aqueles que mais necessitam do apoio concedido pelas
políticas públicas são os que
menos delas se beneficiam. Também perdem os
cafeicultores empresariais, pois na expectativa de
adquirir seus contratos de PEPRO deixam de se proteger
pelos tradicionais mecanismos de hedge em Bolsa. Assim,
a política contribui para um desaprendizado
dessa importante ferramenta de gestão da comercialização.
O terceiro elemento fundamental dessa estrutura de
análise traduz-se pela transparência
de mercado. O prêmio em sua versão anterior,
ao atender preferencialmente as cooperativas de cafeicultores,
tornou o desembolso uma verdadeira caixa preta, impossível
inclusive de ser auditada, como pleiteiam os representantes
do CeCafé. Diante desse incomensurável
erro anterior, não seria pertinente propor
uma nova modalidade de leilão dos contratos.
Aproveita-se, assim, da estrutura absolutamente eficaz
e transparente executada pelo Banco do Brasil em seus
rotineiros leilões de cafés pertencentes
aos estoques públicos. Por meios eletrônicos,
qualquer torrefadora do país pode se credenciar
à aquisição dos lotes oferecidos,
e os lances podem ser acompanhados por todos os participantes
do aviso de venda. Com a maior facilidade desse mundo,
poderia o mesmo sistema ser empregado nos leilões
de contratos do PEPRO e a própria instituição
financeira ser a receptora dos depósitos referentes
a cada contrato negociado. Sistema limpo, claro, transparente,
como recomenda a boa política.
Ao ser implementada pela Companhia Nacional de Abastecimento
(CONAB), a versão anterior do PEPRO foi eivada
por excesso de burocracia. Um enorme contingente de
cafeicultores, especialmente os familiares não-participantes
de cooperativas de produção, praticamente
não teve como participar dos leilões,
criando-se assim um privilégio absolutamente
espúrio. A desburocratização
é uma exigência para a eficácia
da política e, para isso, bastam poucas medidas,
como a verificação da adimplência
do CPF do adquirente junto ao Cadastro de Inadimplentes
(CADIN) para o credenciamento da aquisição.
Por fim, alcançamos a problemática da
gestão. A estrutura que mais bem pode gerir
essa política é a burocracia de governo,
em se tratando de um subsídio concedido pelo
Tesouro aos cafeicultores que adquirirem os contratos
por meio do pagamento do respectivo prêmio associado,
ou seja, técnicos devidamente habilitados,
relativamente imunes a ação de lobbies
interessados em capturar privilégios para qualquer
uma das partes envolvidas. Em se tratando de dinheiro
público, derivado do recolhimento de impostos,
somente uma gestão eminentemente pública
pode lograr o pretendido êxito no desejável
esforço de proteção da renda
dos cafeicultores.
Celso
Luis Rodrigues Vegro
Mestre em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade
e Pesquisador do IEA
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