Nos
últimos anos, o setor agropecuário tem
se destacado por proporcionar formidáveis superávits
cambiais pelo suprimento aos mercados mundiais dos
excedentes agrícolas e pecuários. A
par dessa boa performance – que também
contribuiu, lembremos, para a contenção
do processo inflacionários – os agricultores
brasileiros enfrentam o perigo de iminente risco à
sustentabilidade de suas atividades. Atenta a esta
situação, a Revista do Café traz
ao leitor reportagens e depoimentos abordando alguns
aspectos do “pacote de maldades” que se
perpetra (ou se consente), contra o campo.
Vejamos. Há em curso um conjunto de ações
e pressões exercidas por grupos, em geral ONGs,
com atuação em áreas governamentais
de sua influência. Embora não pareçam
exibir um processo de articulação entre
si, até por falta de competência, desestabilizam
o sistema produtivo, desestimulam investimentos e
põe em evidência a descoordenação
entre os diversos órgãos do governo
com atribuições na agropecuária.
Estas questões são abrangentes, e vão
desde a demarcação de terras indígenas,
temas relacionados ao meio ambiente, até as
coisas mais simples como a fiscalização
sobre os direitos sociais dos contratos de trabalho,
em um inter-relacionamento que tende a se alastrar
e tirar a tranqüilidade de todas as regiões
produtoras do país. Neste contexto, tem muita
propriedade a recente afirmação do ministro
Reinhold Stephanes, da Agricultura, sobre os riscos
da descontinuidade da produção agropecuária
no país.
Entre as questões importantes emerge a demarcação
da reserva Raposa Terra do Sol, em Roraima, ora sob
julgamento do Supremo Tribunal Federal, STF. Com o
voto favorável do ministro relator Ayres Brito
à tese da demarcação contínua-extrusão
(saída forçada, expulsão de produtores
de arroz), o julgamento foi interrompido com o pedido
de vistas do Ministro Carlos Alberto Direito. Em vigoroso
artigo nesta edição, o Deputado Aldo
Rebelo (PCdoB/SP), analisa a questão sob os
ângulos da formação social e étnica
do Brasil, da preservação da fronteira
do país e da integridade do território
nacional. Destacou que “o clássico vazio
populacional, a fronteira politicamente inerte condensam
uma vulnerabilidade perigosa na Raposa Serra do Sol”
e que “os indígenas, e nem deles tanto
se cobra, não formam uma sentinela geopolítica
da extensa zona de fronteira em que se espalha a reserva,
(...) e há quem lhes incuta idéias distintivas
de nação, povo, soberania, autodeterminação”,
lembrando que “foi seduzindo tribos e fincando
sua bandeira, que o Império Britânico,
no século passado, abocanhou 19 mil quilômetros
quadrados do atual estado de Roraima”.
A situação indígena se estende
também para o Mato Grosso do Sul e Bahia. Em
artigo publicado nesta edição, Xico
Graziano, secretário do Meio Ambiente de SP,
cita as ações da FUNAI no MS, trazendo
pavor aos produtores e ameaçando cerca de 30.000
deles, responsáveis por cerca de 60% da produção
de grãos da região. Menciona que uma
área de 10 milhões de hectares vai ser
visitada por antropólogos oficiais, em busca
de resquícios de ocupação dos
índios, em cumprimento de Portarias publicadas
pelo governo em julho de 2008. Fazendas antigas, com
mais de 100 anos de titulação, despertam
a cobiça de grupos do MST e de indígenas
que estão vindo, desde 2004, do Paraguai, como
herdeiros da “nação indígena”
que teria habitado a região e que o governo
procura. No Sul da Bahia, surgem problemas na reserva
indígena pataxó/caramuru, onde se pleiteia
a demarcação adicional de 54 mil hectares,
concedidas pelo estado da Bahia a não-indios
em 1967, também em discussão no STF.
Na mesma direção, o Governo Federal
contribuiu com a edição do Decreto 6514,
de julho de 2008, a pretexto de regulamentar a lei
de crimes ambientais. Criou-se, indiretamente, a supressão
de grande contingente de área, hoje produtiva.
Segundo Cesário Ramalho, presidente da SRB
– Sociedade Rural Brasileira, “sem alterações,
o Decreto reduziria em cerca de 15% (35 milhões
de hectares) a área de produção
rural do país, eliminando importantes áreas
de produção de café no Espírito
Santo e Minas Gerais” (ver matéria nesta
edição).
Por fim, não há como deixar de destacar
as questões ligadas à fiscalização
de direitos sociais das relações de
trabalho que estão ocorrendo nas áreas
rurais dos estados de Minas Gerais e São Paulo.
Desprovido de qualquer conteúdo preventivo
e de orientação, ignorando particularidades
do trabalho no campo, o foco da atuação
parte erroneamente do conceito de que zelar pelos
direitos do trabalhador significa punir e atuar contra
o empregador rural.
É surpreendente como, dentro desse clima de
conflitos, a agropecuária brasileira vem apresentando
os desempenhos que exibe. Contudo, não parece
viável sustentar os atuais níveis de
produtividade e competitividade para o futuro, em
prejuízo dos interesses da sociedade brasileira.
Guilherme
Braga Abreu Pires Filho
Presidente do CCCRJ e Diretor Geral do CECAFÉ |